O clima seco, uma noite fria, uma mulher e seu esposo com um filho por nascer. Infelizmente, o nascimento da criança não se deu no melhor lugar do povoado, e sim, em um estábulo. O evangelista Lucas nos traz o nascimento do Cristo - “e deu à luz seu filho primogênito, e, envolvendo em faixas, reclinou-o num presépio; porque não havia lugar para eles na hospedaria”. Atualmente, vive-se presépios ao redor do mundo pois, ainda hoje, mães e seus filhos estão ao relento e à margem da sociedade. Como na música de Alceu Valença: “Tu vens, tu vens... Eu já escuto os teus sinais”.

A noite de Greccio
Embora o presépio faz-se como um símbolo do Natal de muitas famílias, sabe-se muito pouco de sua origem. Sem dúvidas, o primeiro presépio constitui-se como o próprio Cristo na manjedoura. Além disso, a demonstração do nascimento do Menino Jesus deu-se em meio à Idade das Trevas, na Itália.
Felizmente, Francisco de Assis e seus irmãos menores amavam Jesus de forma simples e bela e, na proximidade do Natal daquele ano, o pobrezinho de Assis resolveu reproduzir o nascimento de Jesus em uma gruta nas redondezas, a narrativa em questão torna-se conhecida como “A noite de Greccio”.
Francisco encontrava-se em Roma e, daquele local parte para o vale de Rieti com o intuito de preparar a festa do Natal do Senhor, que naquele ano quis celebrá-lo de forma simples e especial. Felizmente, em frente à aldeia de Greccio havia uma gruta, como se estivesse pronta para os momentos que se sucederam ao instante, a celebração contou com menino de verdade, mãe de verdade, com boi e burro de verdade e, claro, a gruta estava construída como se fosse para ocasião.
Alegremente, Francisco preparou tudo, vieram de todas partes camponeses, artesãos, aldeãos com tochas acesas iluminando a bela noite estrelada - o campo encheu-se de luz e canções, as estrelas claras e a lua pareciam pular e tremer no céu, as pedras da gruta estavam douradas por conta da luz das tochas, o Poverello cantava, dançava e sorria: todo o seu semblante estava luminoso. Num presépio cabem-se todos os rostos! É o grande encontro dos simples, dos normais, dos marginais, dos ternos, fraternos, sofridos e excluídos. Quando o diferente se encontra temos a mais bela paisagem do mundo. Tudo se torna transparente na unidade das diferenças. Num presépio não existe preconceito, existe sim aquela silenciosa e calma contemplação da beleza de cada um, de cada uma. Encarnar-se é morar junto e respeitar o diferente! Paz na Terra aos Humanos de vontade boa e bem trabalhada! Isso é que encantou Francisco de Assis!

Anunciação 
A espiritualidade franciscana nos mostra jesus simples e pobre, o Verbo faz-se carne na mais pura forma de demonstrar amor aos seus irmãos. Além disso, a igreja vive o tempo da anunciação da vinda de Jesus, que são as quatro semanas antes do Natal - Advento.
Segundo o Papa Francisco, “O Advento é o tempo que nos é concedido para acolher o Senhor que vem ao nosso encontro, também para verificar o nosso desejo de Deus, para olhar em frente e nos preparar ao regresso de Cristo. Ele voltará a nós na festa do Natal, quando fazemos memória da sua vinda histórica na humildade da condição humana; mas vem dentro de nós todas as vezes que estamos dispostos a recebê-lo, e virá de novo no fim dos tempos para ‘julgar os vivos e os mortos’. Por isso, devemos estar vigilantes e esperar o Senhor com a expectativa de o encontrar”.
Alegremente, vivencia-se um momento de reflexão, e isso perpassa pelo perdão e a esperança em modificar-se com intuito de progredir e crescer espiritualmente. Por isso, faz-se fundamental nos prepararmos para vivenciar o advento da melhor forma possível.

Os presépios do mundo
O presépio que trouxe ao mundo o Menino Jesus, em condições de extrema pobreza material, não se faz exclusividade do Cristo. Atualmente, muitas são as crianças que nascem em condições piores e, ainda, ocorre o abandono por suas famílias que, na grande maioria das vezes, não possuem condições para criá-los. A saber, no Brasil, 47 mil crianças e adolescentes crescem nos abrigos mas, desses, apenas 7.300 estão aptos judicialmente para serem adotados, segundo balanço do Cadastro Nacional de Adoção (CNA) e do Cadastro Nacional de Crianças e Adolescentes Acolhidos (CNCA). Tristemente, o Brasil tem inúmeras crianças sem famílias, e também, muitos lares que não tem condições de sustentar os seus filhos. Por exemplo, a extrema pobreza subiu no Brasil e já soma 13,5 milhões de pessoas sobrevivendo com até 145 reais mensais. O número de miseráveis vem crescendo desde 2015, invertendo a curva descendente da miséria dos anos anteriores.
Diante disso, algumas discussões são fundamentais aos tempos em que vivemos, pois faz-se salutar que tenhamos compreensão da importância do diálogo em relação a determinadas questões. O aborto, por exemplo, constitui-se realidade na vida de mulheres de todos os credos e classes sociais e, por mais que a criminalização impeça, em parte, essa prática, criando também diversos riscos para a saúde das mulheres, centenas de abortos são feitos todos os dias no Brasil.
Segundo dados do IBGE, estima-se que 7,4 milhões de brasileiras já fizeram pelo menos um aborto. A Pesquisa Nacional do Aborto revela que mais de 500 mil mulheres abortaram apenas em 2015. Uma em cada cinco mulheres até 40 anos já fez, pelo menos, um aborto na vida. Essas mulheres geralmente são jovens, já tiveram filhos e seguem religiões cristãs. Mulheres comuns que, por dificuldades econômicas, situações de violência ou vulnerabilidade, planejamento pessoal ou qualquer outra razão, decidiram interromper uma gravidez, muitas vezes carregando o peso de deixar uma vida, mas encarando o sofrimento por não encontrarem alternativas, apesar das condenações morais e do sistema penal.
Não bastasse, o abandono paterno faz-se recorrente no Brasil. Se olharmos para familiares, amigos ou até mesmo você, existem inúmeros casos de pais que abandonam os filhos, sequer os assume ou aparece de vez em nunca – e isso se revela muito mais comum do que se pensa. Segundo dados do Conselho Nacional de Justiça, 5,5 milhões de crianças brasileiras matriculadas em escolas não têm o nome do pai em seus registros de nascimento. Por mais que o relacionamento não tenha dado certo, usar essa justificativa para abandonar a criança não é válido, apesar de ser conveniente para muitos homens.
Os presépios estão por toda parte do mundo e não se restringem somente ao Brasil ou apenas a essas realidades, mas se optou por evidenciá-las também para que se entenda a seriedade dos movimentos sociais e lutas adjacentes que objetivam reduzir tais casos.

A luz
Por conseguinte, faz-se fundamental vivenciar o momento novo em nossas vidas, a vinda de Jesus vem iluminar os corações em angústia, sofrimento e tristeza, reforçando a esperança dentro de cada irmão e irmã. Alegremente, o Poverello vivenciou de modo sublime o nascimento do Cristo, o mistério inaudito de Deus altíssimo e poderoso que, para manifestar-nos Seu Amor, torna-se uma criança pobre, frágil e indefesa, filho de mãe pobre e humilde. Ternamente, disse que, nessa noite, o céu se havia unido à Terra, e a Terra se tornara caminho do Céu. Desde então, havia uma razão para viver.
Além disso, não se ignora a fragilidade dos presépios sociais do mundo e isso traz a reflexão do quão importante constitui-se o cuidado com o outro, que perpassa por discussões de grande relevância e necessidade de diálogo em sociedade, como aborto e abandono parental. O que gera a descaracterização e o enfraquecimento da família? O que nós, cristãs e cristãos, fazemos para mudar essas realidades? Quantos são os presépios montados, vivos, e esquecidos nas periferias, nos campos de refugiados, nos locais que ninguém enxerga, com problemas que ninguém se importa?
A Luz, que vem de Jesus – “E o Verbo se fez carne” – se manifesta como forma de (re)começar: o Cristo vem trazer esperança para os corações!
Alegremente, o Papa Francisco dedica a carta Apostólica Admirável Sinal (Admirabile signum) ao presépio para ressaltar o seu significado: “O presépio é um convite a “sentir” a “tocar” a pobreza que escolheu, para si mesmo, o filho de Deus na sua encarnação, tornando-se assim, implicitamente, um apelo para o seguirmos pelo caminho da humildade, da pobreza, do despojamento”. Afinal, recorda-se da esperança que Jesus traz às famílias, a Luz que vem nos iluminar em meios às trevas. Portanto, que estejamos vigiando os caminhos, pois relembra São Paulo, “A noite já vai adiantada, o dia vem chegando”.

“Tu vens, tu vens...
Eu já escuto os teus sinais!”


Aislan Soares Viçosa
Secretário Regional de Formação - Sul III

FONTES:
Francisco Uma Vida Que Questiona (modificado) - Fernando Uribe Escobar, O.F.M
Carta de São Paulo aos Romanos (13, 11-14)
Evangelho de Lucas - O nascimento
Carta Apostólica Admirável Sinal - Admirabile Signum
Fontes Franciscanas: Tomás de Celano - primeira vida (1Cel-85)
Música: Alceu Valença - Anunciação