Fumaça, desmatamento, temperatura subindo, calotas polares derretendo, deslizamentos, falta d’água, secas cada vez mais severas, esgoto lançando pelas ruas, contaminação dos solos, poluição dos oceanos e espécies desaparecendo... Não, isso não é o apocalipse, mas uns dos muitos desafios que nossa querida geração tem que resolver.
No Capítulo 1 do livro dos Gêneses, o poema escrito pelos sacerdotes, nos fala que Deus, ao longo dos cinco primeiros dias, fez várias coisas e viu que eram boas. No sexto dia, fez o homem à sua imagem e semelhança e o fez dominar sobre o resto da criação. Nos capítulos 2 e 3, os autores entram em detalhes da criação e na origem do mal, este último liga-se a sensação de autossuficiência do homem em relação a Deus.
O comportamento de egoísmo do homem, descrito no livro dos Gêneses, perdura até os dias atuais e essa atitude egocêntrica está nos levando a cometer aquilo que o filósofo Mario Sergio Cortella chama de biocídio.
O biocídio nada mais é de uma autodestruição do homem em virtude do comportamento predatório empregado pela nossa sociedade nos dias atuais, consumindo os recursos do planeta em um ritmo cada vez maior.
Para termos uma ideia do nosso consumo, o Instituto Norte Americano Worldwatch Institute publicou, em 2010, a obra o Estado do Mundo relatando que em 2006 o gasto com bens e serviços foi de US$ 30,5 trilhões de dólares incluindo-se despesas com alimentação e moradia; no entanto, com o aumento da renda discricionária, as pessoas passaram a gastar mais em bens de consumo: alimentos mais pesados, moradias maiores, televisões, carros, computadores e viagens de avião. Só em 2008, pessoas no mundo todo compraram 68 milhões de veículos, 85 milhões de geladeiras, 297 milhões de computadores e 1,2 bilhão de telefones móveis (celulares). O consumo teve um crescimento tremendo nos últimos cinquenta anos, registrando um aumento de 28% em relação aos US$ 23,9 trilhões gastos em 1996 e seis vezes mais do que os US$ 4,9 trilhões gastos em 1960. Parte desse aumento é resultante do crescimento populacional, mas o número de seres humanos cresceu apenas a uma razão de 2,2 entre 1960 e 2006. Sendo assim, os gastos com consumo por pessoa praticamente triplicaram. Como o consumo aumentou, mais combustíveis, minerais e metais foram extraídos da terra, mais árvores foram derrubadas e mais terra foi arada para o cultivo de alimentos (muitas vezes para alimentar gado, visto que pessoas com patamares de renda mais elevada começaram a comer mais carne). Entre 1950 e 2005, por exemplo, a produção de metais cresceu seis vezes, a de petróleo oito, e o consumo de gás natural 14 vezes. No total, 60 bilhões de toneladas de recursos são hoje extraídas anualmente – cerca de 50% a mais do que há apenas 30 anos. No final das contas, o mundo extrai o equivalente a 112 edifícios Empire State da Terra a cada dia. A exploração desses recursos para a manutenção de níveis de consumo cada vez mais altos vem exercendo pressão crescente sobre os sistemas da Terra e esse processo vem destruindo com grande impacto os sistemas ecológicos dos quais a humanidade e incontáveis outras espécies dependem.
Em entrevista para o site R&A Negócio e Sustentabilidade, realizada por Simone Silva Jardim, Cortella nos coloca que: “a nossa sociedade de consumo impulsiona o jovem a supor que a felicidade que ele possa sentir ou ter na vida é estar na posse material. Uma sociedade como a nossa, que faz publicidade associando o heroísmo do esporte ao consumo de bebidas alcoólicas, algo que faz jovens de 12 a 20 anos, cujas mentes estão em formação, supor erroneamente que a ascensão social é obtida pelo consumo de álcool. Pior: a sociedade adulta diz hoje para os jovens que, para eles não haverá futuro, não haverá meio ambiente, não haverá trabalho e não haverá segurança. Também tenta convencê-los de que eles não têm infância, que a música que eles gostam não passa de barulho, que as suas roupas são andrajos, que a sua comida é porcaria. Estou dizendo a um humano em formação que ele não tem história. Isso provoca uma sensação de desespero muito grande entre os jovens, o que faz com que muitos escolham viver o presente até o esgotamento... Os jovens fazem tudo no limite máximo. Não por acaso estamos tendo um aumento no campo epidemiológico da população a partir dos 15 anos com problemas cardiológicos. Soma-se a isso a erotização precoce veiculada pela mídia e seu grave impacto na educação, pois meninas grávidas deixam a escola e seus filhos têm um risco maior de seguir o mesmo caminho. Temos esses dois polos de pressão: o que diz ao jovem que ele não terá futuro e nosso sistema, que lucra com sua ansiedade e o impulsiona com sopros de consumo para o precipício. É preciso cuidado com o cinismo reinante que afirma estar esta juventude perdida. Quando um jovem alcoolizado ao volante provoca uma colisão com vítimas fatais, muitos usam o fato para defender penas mais rigorosas, além de levantar bandeiras como a responsabilização criminal a partir dos 16 anos ou menos. Este jovem também é uma vítima, não uma vítima em absoluto, pois ele tem consciência de seus atos, mas ele ainda é um ser em formação. Os jovens não nascem prontos. Alguém tem que se responsabilizar por eles até que sejam adultos”.
Leonardo Boff em seu livro lançado em 2004 Ecologia: Grito da Terra, Grito dos Pobres coloca a ecologia como “a arte nova e novo padrão de comportamento dos seres humanos frente à natureza, aos ecossistemas e aos mais diversos seres que estão em uma interdependência de todos com todos”. Coloca-nos em um patamar juntamente com as outras espécies ao falar que todos nós partimos de uma mesma criação e da harmonia de todas as criaturas consigo mesmo e os demais elementos naturais. Também nos adverte quando ao nosso “ambientalismo”, pois muitas das vezes, ao falamos de desenvolvimento, não falamos em sociedade, não defendemos a vida e a promoção da qualidade da vida humana.
Boff dedica um subcapítulo sobre nosso Pai Seráfico, falando da sua relação fraterna com os irmãos nas suas diversas categorias. São Francisco notou que os eventos naturais e todos os seres vivos estão ligados, sendo conduzidos por Deus; colocou-nos como membro de uma mesma família, pois temos o mesmo criador e, se possuímos esse elo fraterno, devemos viver em harmonia.
A família de São Francisco, ou seja, a harmonia cósmica em ver tudo como obra de Deus e vivência o amor com o próximo, com os seres vivos e a natureza encontra-se ameaçada; ameaça praticada pelo consumismo predatório do planeta que está nos levando a ser a primeira espécie do planeta a “suicidar-se”.

Para evitar o nosso desaparecimento da face da Terra temos que mudar o nosso comportamento em relação à natureza, educar os mais novos e alertar os mais velhos em relação ao consumismo, vivenciar e testemunhar o amor ao nosso Deus, que nos deixou dominar suas criações, dominação que não pode ser expressa na forma predatória dos recursos naturais, mas sim na forma harmoniosa de viver com a criação.

Getúlio Martins 
Secretário Regional de Formação - NE A1