Depois de surpreender todo o mundo tendo sido anunciado na Basílica de São Pedro como Papa Francisco, demonstrando inspirar-se no “pobre de Assis”, mais uma vez todas as atenções mundiais voltam-se para o Papa ao escrever a sua primeira Carta Encíclica: Laudato Si, toda ela perpassada pela espiritualidade franciscana, incluindo o título que traduzindo para o português: “Louvado sejas”, que expressa o engrandecimento do Criador no Cântico das Criaturas escrito por São Francisco.
Segundo Dom Bosco, Bispo de Osasco – SP, “Uma Encíclica é a palavra mais autorizada e mais solene do magistério do Papa. Não é uma Exortação Apostólica nem um “Motu Proprio” ou um discurso de ocasião. É um pronunciamento oficial, esperado por todo o mundo.“.  Nesta Encíclica, em especial, o Papa não se dirige apenas aos católicos, mas “a cada pessoa que habita neste planeta” com a pretensão de “entrar em diá­logo com todos acerca da nossa casa comum”, o planeta Terra. Diante da proposta de diálogo, percebemos que o Papa Francisco não se limita a um discurso fechado, como um manual de instruções, mas apresenta uma proposta aberta que está em construção.
Nas primeiras páginas da Carta Encíclica, o Papa faz uma retomada à palavra de seus predecessores a respeito dos progressos científicos e suas consequências no ambiente natural, bem como do Patriarca Ortodoxo Bartolomeu, reforçando um diálogo aberto e ecumênico. Em seguida dedica quase três páginas a São Francisco de Assis que, segundo o Papa, é um “modelo belo e motivador” e confessa que tomou o seu nome como “guia e inspiração”. Para nós, saber que o Papa se inspira em quem é para nós um pai é motivo de muita alegria e esperança, e por isso é que proponho a reflexão do recorte da “Laudato Si” em que o Papa apresenta a sua visão sobre o Santo de Assis e de como o inspira na reflexão do cuidado com a casa comum:

São Francisco de Assis

Não quero prosseguir esta encíclica sem in­vocar um modelo belo e motivador. Tomei o seu nome por guia e inspiração, no momento da mi­nha eleição para Bispo de Roma. Acho que Fran­cisco é o exemplo por excelência do cuidado pelo que é frágil e por uma ecologia integral, vivida com alegria e autenticidade. É o santo padroeiro de todos os que estudam e trabalham no campo da ecologia, amado também por muitos que não são cristãos. Manifestou uma atenção particular pela criação de Deus e pelos mais pobres e aban­donados. Amava e era amado pela sua alegria, a sua dedicação generosa, o seu coração universal. Era um místico e um peregrino que vivia com simplicidade e numa maravilhosa harmonia com Deus, com os outros, com a natureza e consigo mesmo. Nele se nota até que ponto são insepa­ráveis a preocupação pela natureza, a justiça para com os pobres, o empenhamento na sociedade e a paz interior.
O seu testemunho mostra-nos também que uma ecologia integral requer abertura para cate­gorias que transcendem a linguagem das ciências exatas ou da biologia e nos põem em contacto com a essência do ser humano. Tal como acon­tece a uma pessoa quando se enamora por ou­tra, a reação de Francisco, sempre que olhava o sol, a lua ou os minúsculos animais, era cantar, envolvendo no seu louvor todas as outras cria­turas. Entrava em comunicação com toda a cria­ção, chegando mesmo a pregar às flores «convi­dando-as a louvar o Senhor, como se gozassem do dom da razão». A sua reação ultrapassava de longe uma mera avaliação intelectual ou um cálculo econômico, porque, para ele, qualquer criatura era uma irmã, unida a ele por laços de carinho. Por isso, sentia-se chamado a cuidar de tudo o que existe. São Boaventura, seu discípulo, contava que ele, «enchendo-se da maior ternura ao considerar a origem comum de todas as coi­sas, dava a todas as criaturas – por mais desprezí­veis que parecessem – o doce nome de irmãos e irmãs». Esta convicção não pode ser desvalori­zada como romantismo irracional, pois influi nas opções que determinam o nosso comportamen­to. Se nos aproximarmos da natureza e do meio ambiente sem esta abertura para a admiração e o encanto, se deixarmos de falar a língua da frater­nidade e da beleza na nossa relação com o mun­do, então as nossas atitudes serão as do domina­dor, do consumidor ou de um mero explorador dos recursos naturais, incapaz de pôr um limite aos seus interesses imediatos. Pelo contrário, se nos sentirmos intimamente unidos a tudo o que existe, então brotarão de modo espontâneo a so­briedade e a solicitude. A pobreza e a austeridade de São Francisco não eram simplesmente um as­cetismo exterior, mas algo de mais radical: uma renúncia a fazer da realidade um mero objeto de uso e domínio.
Por outro lado, São Francisco, fiel à Sagra­da Escritura, propõe-nos reconhecer a natureza como um livro esplêndido onde Deus nos fala e transmite algo da sua beleza e bondade: «Na grandeza e na beleza das criaturas, contempla-se, por analogia, o seu Criador» (Sab 13, 5) e «o que é invisível n’Ele – o seu eterno poder e divindade – tornou-se visível à inteligência, desde a criação do mundo, nas suas obras» (Rm 1, 20). Por isso, Francisco pedia que, no convento, se deixasse sempre uma parte do horto por cultivar para aí crescerem as ervas silvestres, a fim de que, quem as admirasse, pudesse elevar o seu pensamento a Deus, autor de tanta beleza. O mundo é algo mais do que um problema a resolver; é um mis­tério gozoso que contemplamos na alegria e no louvor. (Carta Encíclica: Laudato si, 2015)

Nestas palavras, o Papa nos demonstra que São Francisco tinha profunda admiração pelas criaturas e uma relação direta de convivência com elas, e por tal modo, não se sentia dono delas, tratava-se de um modo de ser e estar no mundo, não sobre as criaturas como quem as domina, mas de ser e estar junto com elas, tratando-as como irmãos e irmãs. Francisco de Roma ainda nos instiga no final do momento dedicado ao Francisco de Assis dizendo que “o mundo é algo mais do que um problema a resolver; é um mis­tério gozoso que contemplamos na alegria e no louvor.”

A Encíclica vai muito além das quase duzentas páginas. É um documento de forte cunho social e trata a questão ecológica não apenas de forma intelectualizada, mas com emoção. Chama-nos a sermos co-responsáveis pela nossa casa comum de ante de tantos sinais de destruição em que nos são visíveis.
Que esta carta escrita pelo Papa a todos que vivem nesta casa comum, possa trazer aos nossos corações o sentimento de atenção e cuidado ao nosso Planeta Terra, como filhos desta mãe que nos sustenta.

                                                                         Larissa Lima
                                                      Secretária Regional de Formação - SE 1


Referências:

Coletânea de textos do site: http://www.franciscanos.org.br/?p=89065